É no cotidiano que construímos nossas memórias afetivas. Imagem Dulci Dantas |
Nas últimas semanas tive contato com fatos interessantes na vida de duas amigas. Uma delas, médica em missão com os Médicos sem Fronteiras, relatou a dura e triste realidade das crianças atingidas - no corpo e na alma - pela guerra no Iraque. A minha outra amiga, vizinha e mãe de uma amiguinha da minha filha, foi chamada na escola. Com o coração apertado, ela foi conversar com a professora. O que seria? A escola queria conversar com a mãe porque a pequena estava abraçando demais os coleguinhas. Alguns ficavam até bravos, pois a menina abraça com gosto, abraço de alegria, de afeto, de carinho. Quando ela e minha filha se encontram sempre rola o maior abraço de felicidade. A minha amiga, um pouco atônita, compartilhou essa experiência no perfil dela em uma rede social. Eu, que acabara de ler o relato da minha primeira amiga médica, respondi para minha amiga vizinha:"O mundo vai ter que se acostumar com o Amor!".
De um lado do mundo a infância que chora. Do outro lado, a infância que abraça. Quando foi que abraçar virou problema de disciplina escolar? Não consegui resistir a juntar os dois acontecimentos, misturá-los dentro de mim e fazer a seguinte pergunta: É possível que, num mesmo mundo, crianças sejam repreendidas por abraçar os amigos, enquanto outras morrem asfixiadas por efeito de armas químicas?
Tudo isso me fez refletir ainda mais sobre um assunto no qual venho pensando há tempos, desde que minha filha nasceu: Memória Afetiva.
O nascimento dos filhos parece ter o poder de resgatar do fundo de nós camadas sedimentadas de sentimentos, sensações e experiências. Desde o primeiro momento de vida de Melina, me senti profundamente responsável por criar as condições mais favoráveis para que ela possa construir suas próprias memórias afetivas, de maneira positiva e saudável. E então descobri que isso envolve tudo: A vida com todas as suas facetas, todos os dias e momentos de convivência, e também de ausência. Desde a maneira como você desperta a criança pela manhã e lhe dá bom dia. Os alimentos que você oferece a ela, e como compartilha as refeições em família. O contato visual que fazemos com a criança, quando ela precisa se sentir segura, reconhecida, vista. O tempo que dedicamos a estar com ela e conhecê-la. Os cuidados no vestir, no banhar, no ninar, no acolher. Em como transformamos momentos simples e cotidianos em memórias da infância de um ser humano, que nós decidimos trazer para o mundo. Memórias que fundam a base emocional, que escrevem os primeiros capítulos de uma história de vida. Foi então que o relato da minha amiga médica me impactou de uma maneira profunda. O que está sendo impresso na memória afetiva das crianças que têm sua infância agredida pela guerra?
De um lado do mundo a infância que chora. Do outro lado, a infância que abraça. Quando foi que abraçar virou problema de disciplina escolar? Não consegui resistir a juntar os dois acontecimentos, misturá-los dentro de mim e fazer a seguinte pergunta: É possível que, num mesmo mundo, crianças sejam repreendidas por abraçar os amigos, enquanto outras morrem asfixiadas por efeito de armas químicas?
Tudo isso me fez refletir ainda mais sobre um assunto no qual venho pensando há tempos, desde que minha filha nasceu: Memória Afetiva.
O nascimento dos filhos parece ter o poder de resgatar do fundo de nós camadas sedimentadas de sentimentos, sensações e experiências. Desde o primeiro momento de vida de Melina, me senti profundamente responsável por criar as condições mais favoráveis para que ela possa construir suas próprias memórias afetivas, de maneira positiva e saudável. E então descobri que isso envolve tudo: A vida com todas as suas facetas, todos os dias e momentos de convivência, e também de ausência. Desde a maneira como você desperta a criança pela manhã e lhe dá bom dia. Os alimentos que você oferece a ela, e como compartilha as refeições em família. O contato visual que fazemos com a criança, quando ela precisa se sentir segura, reconhecida, vista. O tempo que dedicamos a estar com ela e conhecê-la. Os cuidados no vestir, no banhar, no ninar, no acolher. Em como transformamos momentos simples e cotidianos em memórias da infância de um ser humano, que nós decidimos trazer para o mundo. Memórias que fundam a base emocional, que escrevem os primeiros capítulos de uma história de vida. Foi então que o relato da minha amiga médica me impactou de uma maneira profunda. O que está sendo impresso na memória afetiva das crianças que têm sua infância agredida pela guerra?
Mas, se nem todos nós podemos atuar diretamente para amenizar as dores do mundo, podemos sim contribuir para que as nossas crianças construam suas memórias afetivas de maneira saudável e feliz. Como ajudá-las a criar essa base emocional que sustentará os adultos que elas serão?
Devemos ter em mente que a rotina, bem como a sua quebra, pode gerar memórias afetivas aconchegantes, nas quais estes seres humanos se reconfortarão e sustentarão durante toda a sua jornada. Estar presente e atento ao momento vivido é fundamental para criar valor emocional a partir de atitudes aparentemente simples, e até repetitivas do nosso cotidiano: A lembrança de um pai que chega sempre acompanhado do melhor cheiro de pão quentinho do mundo. A mãe que oferece o abraço perfumado na saída da escola. A visão das folhas dançando ao vento, no vai-e-vem do balanço da pracinha. O gosto salgado de uma praia que marcou todo o corpo, todos os sentidos, durante as férias. A sensação refrescante e alegre de pular em poças d'água em um dia quente de verão. A lembrança de músicas cantadas dentro do carro ao ir para a escola ou durante uma viagem.
Felicidade é pular em poças d'água. Imagem Dulci Dantas |
Infelizmente, a infância do nosso tempo é constantemente ameaçada por guerras, violência, abandono, pobreza extrema e negligência. Mesmo a infância privilegiada, a que está livre destes problemas agudos, tem sido muito privada da convivência com os pais e da vivência de momentos simples e prazerosos. A pressa, a ausência, a ansiedade, o trabalho excessivo, a falta de tempo, a tecnologia viciante são elementos nocivos a construção de momentos saudáveis, capazes de imprimir felicidade, auto-estima e segurança na memória afetiva de nossas crianças.